Amar de longe

Imagem gerada por IA.

Ele a amava muito, e eles também se amavam. Viviam na mesma casa, mas estavam distantes. Cada um era cada um, vivendo em seu próprio mundo. Estavam perto, mas viviam muito longe.

Boas palavras nunca se ouviam e, ainda que existissem, sempre eram suprimidas. Pensavam: um dia tudo vai estar bem, e então poderemos falar o que sentimos.

No entanto, os anos se passaram e nada mudou. Tudo continuava do mesmo jeito: eles ainda estavam juntos, mas não conseguiam desfrutar da presença um do outro.

Certo dia, então, algo aconteceu: um deles dormiu eternamente. E os que ficaram se mantiveram do mesmo jeito: indiferentes, vazios, sem amor manifesto, nem remorso.

Nos meses seguintes, um deles resolveu mudar de casa e seguir a própria vida, longe daqueles com quem convivera por tanto tempo. Fez as malas, juntou tudo o que não conseguiu deixar e, sem se despedir, partiu. Nem mesmo o seu novo endereço deixou. Queria romper com o passado, mas o levava consigo.

Os que ficaram choraram, mas cada um em seu canto. Ninguém dividiu sua dor. Eles não sabiam como fazer isso. E também não queriam aprender. Ah, se tivessem tentado...

O outro, inspirado pelo primeiro, decidiu também se afastar. Não conseguia lidar com a partida dos outros dois. Sem dizer nada, pôs algumas roupas na mochila, colocou-as no porta-malas e partiu.

Olhando para o que ficava para trás, chorou compulsivamente, mas não havia ninguém ali para consolá-lo. Nada diferente de qualquer outro dia. Apenas mais um dia de dor e solidão.

O único que ficou, ao ver a partida, também evitou demonstrar quaisquer sentimentos. Trancou a janela pela qual viu tudo, fechou a cortina e degustou um café com um pedaço de torrada. Logo após, deitou-se no sofá da sala e, diante da TV ligada em algum telejornal, adormeceu sob os efeitos de uma dezena de comprimidos.

Sua esperança era nunca mais acordar. Porém, uma vizinha, logo pela manhã, bateu à porta e, como ninguém abriu, resolveu entrar.

Lá estava aquela senhora desmaiada sobre a própria saliva.
— Nancy, o que aconteceu com você? Acorde, vamos, acorde.

Em meio a palavras desconexas, ela despertou contra a própria vontade.

Foi-lhe dado um café bem forte. Ela tomou e, enfim, começou a voltar à razão. No fundo, não queria estar viva, mas a morte resolveu poupá-la. Sentia-se uma fracassada: nem morrer conseguia.

O Natal estava próximo. Como ela suportaria ficar sozinha? Sua família havia se desfeito, mesmo podendo se manter unida. Mas eles jamais aceitavam perdoar uns aos outros. Por isso, o castelo ruiu.

 

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