Ego

Imagem criada pelo chatGPT para ilustrar o texto.

Eu cresci num mundo que sempre foi só meu. Nele, existiam apenas dois tipos de pessoas: as que eram eu e as outras, que se pareciam muito comigo. Bem, na verdade, eu não queria falar, mas era de mim mesmo que estava falando. Não havia mais ninguém.

Cresci, por isso, com a certeza de que sempre estive certo. Afinal, eu só falava comigo mesmo e sempre me entendia muito bem. Eu nunca, nunca mesmo, jamais briguei comigo. Pois, é claro, nós — quer dizer, eu — sempre estivemos certos e com toda a razão possível, imaginável e inimaginável.

Quando eu tinha alguma dúvida, perguntava a mim mesmo. E, claro, como já imaginava, eu tinha a resposta. Não qualquer resposta, mas a melhor entre as melhores. Outras vozes soavam próximas aos meus ouvidos. Mas por que eu daria atenção a alguém que não fosse eu mesmo? Eu sei o que sou, o que digo, o que faço e sei que sempre tenho razão. Se não tenho, ninguém jamais me disse.

Mas, caso alguém ousasse dizer, eu certamente ainda estaria certo. Quem me disse isso, além de mim mesmo, para que não fique apenas em minhas opiniões? O meu amigo Narciso. Ele, sim, sabe o que diz. Ele, sim, tem razão. Que cara sábio! Eu jamais deixaria de ouvi-lo, nem por um milésimo de segundo. Eu o conheço bem, e ele também me conhece. Nós somos melhores amigos, talvez até a mesma pessoa.

Não critiquem o meu espelho. Não tenho apego a coisas materiais, mas isso seria demais. Eu não quero parar de me admirar, nem de ouvir o doce e harmônico som da minha voz. Óbvio que nem sempre eu a ouço, mas nisso sou bom. E, se alguém tenta me avisar, eu nego veementemente essa possibilidade. Quem, além de mim, teria razão ou estaria certo?

Sei de tudo o que preciso, não há por que querer aprender algo novo. Aliás, há algo novo? Se houvesse, eu certamente já saberia. Talvez fosse até uma invenção minha. Sim, eu sou o cara que cria, que faz e que acontece. E daí se as pessoas precisam engolir os meus sapos? São os meus sapos. Eles têm o direito que eu lhes dei de serem engolidos.

Parem de falar, chega! Eu não quero ouvir mais nada. Vou me retirar para pensar algumas coisas que pretendo partilhar, num futuro próximo, comigo mesmo.

 

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